Usos e costumes: o Cristão pode beber?

Usos e costumes: o Cristão pode beber?

Blog By mar 05, 2015

Usos e costumes: o Cristão pode beber?

Acho que temas como esse são uma espécie de virose da “Internet gospel”. Não tenho números, mas acredito que haja uma enormidade de pesquisas na Internet sobre esse assunto. Não apenas esse, mas os clássicos: “o Cristão pode ficar?”, “é errado usar biquíni?”, “posso ir pra festa?”, etc. Penso ser legítima a busca pelo conhecimento. A dúvida é a fonte do conhecimento. É nos “porquês” e “o ques” que residem a sabedoria. Contudo, é necessário ter em mente que Deus quer obediência de coração. De nada adianta você ler um texto que o conforte para a prática de algum pecado. Seu coração precisa estar naquilo!

Dito isto, quero deixar claro que esse post não vai responder definitivamente a essa pergunta. Não tenho a pretensão de dizer que meu texto irá acabar com quaisquer dúvidas sobre o tema. São décadas de discussões sobre um mesmo assunto. E não apenas sobre este assunto em particular, mas outros, conforme exemplifiquei acima. Geralmente, nesse tipo de tema, há prováveis “contradições” bíblicas e interpretações dúbias. Isso significa que a Palavra está errada e que não há uma verdade absoluta? De forma alguma. É provável que estejamos sendo insinceros ou tenhamos deixado algo de lado. Todas as perguntas possuem respostas, desde que sejam feitas da forma correta.

Desse modo, assim como em todos os meus textos, vou tentar expor um pouco do que a Palavra de Deus fala, na minha interpretação, sobre o tema. Além disso, é óbvio que a minha opinião é importante para a linha que vou tomar na discussão. Vou tentar ser imparcial no início da análise e, ao final, vou dizer minha opinião. Me acompanhe.

A pergunta do título poderia ser rapidamente modificada para “o Cristão pode se drogar?”, sem perda de sentido. Bebida alcoólica é uma droga como qualquer outra. Isso é atestado em diversas fontes (uma delas você pode acessar aqui). Talvez a pergunta mais adequada seja “o Cristão pode beber moderadamente (socialmente)?”. De qualquer forma, “se drogar moderadamente” soa esdrúxulo. Mas vamos as fatos.

Existem diversas escolas teológicas que entram em conflito nesse ponto. A primeira barreira já trata do fato de estipularmos regras e leis aos filhos de Deus. Por se tratar de um costume, uma prática corriqueira, do dia-a-dia, a questão da bebida alcoólica entra naqueles assuntos que eu chamaria de laterais. Alguns assuntos centrais, como Salvação, amor, Espírito Santo, graça, entre outros, são melhor evidenciados que outros na Palavra. Costumes como o uso do véu, vestimentas, prática ou não da masturbação, entre outros, possuem interpretações variadas e implícitas. Muito dificilmente algum Cristão sincero encorajaria o uso da pornografia como estímulo sexual em um casamento, embora esse tema não seja explicitamente abordado na Bíblia. Sabemos, por outros meios, que isso é errado.

Nesse ponto, entramos na questão de sabermos o quanto nossas práticas aqui afetam nossa salvação. É um lado delicado do tema, que não entraremos em detalhes. Porém, nossas atitudes (ou obras) podem ou não afetar nosso relacionamento com Deus e com as pessoas. Vejamos o que a Palavra nos diz a esse respeito:

“Aquele que diz: “Eu o conheço”, mas não obedece aos seus mandamentos, é mentiroso, e a verdade não está nele.” – 1 João 2:4 (NVI)

Em seguida, João diz o seguinte:

“[…] e recebemos dele tudo o que pedimos, porque obedecemos aos seus mandamentos e fazemos o que lhe agrada.
E este é o seu mandamento: que creiamos no nome de seu Filho Jesus Cristo e que nos amemos uns aos outros, como ele nos ordenou.” – 1 João 3:22-23 (NVI)

Aparentemente, João fala que devemos obedecer aos mandamentos de Cristo e, nos versículos seguintes, explica que esse mandamento é que nos amemos uns aos outros. Interpretações à parte, é simples entender que temos uma obrigação para com os mandamentos de Deus. Veja o que Tiago diz:

Assim também a fé, por si só, se não for acompanhada de obras, está morta. Mas alguém dirá: “Você tem fé; eu tenho obras”. Mostre-me a sua fé sem obras, e eu lhe mostrarei a minha fé pelas obras. – Tiago 2:17-18 (NVI, grifo meu)

Novamente, interpretações à parte, Tiago deixa claro que a forma de demonstrar nossa fé é pelas obras. Se você ler o capítulo todo, entenderá melhor. Um ótimo exemplo é o de dois alunos realizando uma prova de matemática. Ambos dizem que sabem matemática. Entretanto, para demonstrar a inteligência e sabedoria, nada melhor que o resultado da prova para tal. Um deles tira zero e o outro dez. Embora ambos estejam na mesma série, estudaram os mesmos assuntos, declarem saber a matéria, apenas um provou que sabe de fato. Com nossa fé, o mesmo ocorre. Através das nossas atitudes, somos capazes de demonstrar se temos ou não fé.

Paulo não deixa passar em sua carta aos Efésios:

“Porque somos criação de Deus realizada em Cristo Jesus para fazermos boas obras, as quais Deus preparou de antemão para que nós as praticássemos.” – Efésios 2:10 (NVI)

Voltando ao tema. Até então, entendemos três pontos importantes sobre a pergunta do título: 1) Nossas atitudes (beber é uma delas) podem afetar nosso relacionamento com Deus e com nossos irmãos, além das pessoas ao nosso redor; 2) Uma atitude pode ser errada ou certa, a depender da interpretação de como aquilo nos afeta carnal e espiritualmente, o que pode estar implícito; 3) Nossas atitudes demonstram a nossa fé. Não acredito que até aqui haja grandes discordâncias entre teologias e interpretações bíblicas. Não entramos na questão da salvação, conforme eu mencionei anteriormente, por ser extremamente delicado. Deixemos isso para um próximo texto.

Agora, vamos olhar mais de perto alguns textos que falam explicitamente da bebida alcoólica. Antes disso, é importante lembrar do contexto em que foram escritos. Alguns deles datam de milhares de anos antes de Cristo, outros são da época do Filho de Deus. Basta lembrar alguns fatos: 1) Não havia Internet ou qualquer tipo de mídia naquela época; 2) A cultura oriental e local era completamente diferente da cultural ocidental do mundo contemporâneo; 3) Não havia Pilsen, Skol, Brahma, Polar, Salton, Miolo, ou qualquer marca de qualquer tipo de bebida alcoólica naquele tempo. No máximo, havia o vinho que era fabricado em casa. Depois veremos por que esses fatos são importantes.

Vou falar primeiro de alguns textos do Antigo Testamento. Vejamos o que Deus falava na antiga aliança.

“O vinho é zombador e a bebida fermentada provoca brigas; não é sábio deixar-se dominar por eles.” – Provérbios 20:1 (NVI)

“Ouça, meu filho, e seja sábio; guie o seu coração pelo bom caminho. Não ande com os que se encharcam de vinho, nem com os que se empanturram de carne. Pois os bêbados e os glutões se empobrecerão, e a sonolência os vestirá de trapos.” – Provérbios 23:19-21 (NVI)

“à prostituição, ao vinho velho e ao novo, o que prejudica o discernimento do meu povo.” – Oséias 4:11 (NVI)

“Depois o Senhor disse a Arão: “Você e seus filhos não devem beber vinho nem outra bebida fermentada antes de entrar na Tenda do Encontro, senão vocês morrerão. É um decreto perpétuo para as suas gerações. Vocês têm que fazer separação entre o santo e o profano, entre o puro e o impuro.” – Levítico 10:8-10 (NVI)

Esses são apenas alguns dos muitos textos da velha aliança que desaconselham o uso do vinho para quaisquer circunstâncias. Note que não é claro que estejam se referindo ao excesso, mas à simples prática de beber. Aparentemente, o vinho não era bem visto na antiga aliança. É importante mencionar que a Bíblia fala muito em vinho, por ser a bebida alcoólica mais comum àquele tempo, nas condições e cultura em que estavam inseridos. Vamos entender que quando a Palavra fala do vinho como agente de embriaguez, podemos extender as verdades para as bebidas alcoólicas modernas (cerveja, por exemplo).

Embora o Antigo Testamento mencione o vinho como algo nocivo, há passagens do Novo Testamento que também o fazem. Por outro lado, talvez o que mais gere discórdia nas opiniões, há textos que parecem encorajar o seu uso. Ademais, por se tratar de um costume, há inúmeros argumentos pró e contra. Vamos tentar analisá-los com cuidado. Abaixo, alguns dos principais textos do NT sobre o consumo de bebidas alcoólicas:

“Não se embriaguem com vinho, que leva à libertinagem, mas deixem-se encher pelo Espírito.” – Efésios 5:18 (NVI)

“Vocês não sabem que os perversos não herdarão o Reino de Deus? Não se deixem enganar: nem imorais, nem idólatras, nem adúlteros, nem homossexuais passivos ou ativos, nem ladrões, nem avarentos, nem alcoólatras, nem caluniadores, nem trapaceiros herdarão o Reino de Deus. Assim foram alguns de vocês. Mas vocês foram lavados, foram santificados, foram justificados no nome do Senhor Jesus Cristo e no Espírito de nosso Deus.” – 1 Coríntios 6:9-11 (NVI, grifo meu)

“Não continue a beber somente água; tome também um pouco de vinho, por causa do seu estômago e das suas freqüentes enfermidades.” – 1 Timóteo 5:23 (NVI)

Selecionei alguns poucos versículos, pois do contrário eu precisaria aprofundar muito mais o tema. Uma rápida busca no Google já mostra os versículos todos que falam sobre isso. Nos que citei, o mais intrigante é o versículo de Paulo a Timóteo. Em duas ocasiões, nos textos anteriores, Paulo orienta que não devemos nos embriagar e que os alcoólatras não entrarão no Reino de Deus. Posteriormente, no entanto, parece aconselhar um de seus jovens discípulos a beber vinho. Essa contradição é interessante, pois não é necessariamente contraditória. Embriagar-se e beber podem ser coisas diferentes. Mas e no caso de Jesus? Ele transformou água em vinho e celebrou a ceia com a bebida. Essas aparentes contradições nos levam a questionar. Se realizarmos uma pesquisa sobre o tema, rapidamente vamos descobrir algumas verdades. A primeira delas é que o termo vinho, em antigas definições, poderia significar simplesmente o suco da uva. A etimologia aqui é de grande importância. Se no lugar de vinho, a Palavra trouxesse sempre a expressão “xarope da uva”, ficaríamos em constantes dúvidas sobre o verdadeiro sentido. A segunda é que há pelo menos três palavras no original para o termo vinho. Cada qual com seu significado. Em alguns momentos, vinho efetivamente significa fermentado e em outros não-fermentado. A terceira é que alguns versículos nos atestam que o vinho embriaga, portanto não podemos dizer que todo o vinho bíblico é sem álcool.

Com essas verdades em mãos, podemos concluir que em determinados momentos a Palavra fala do suco e em outros do vinho. Para aprofundar o entendimento nesse assunto, sugiro a leitura deste texto. Para os fins do nosso assunto, basta saber que nem todos os vinhos são alcoólicos. Para ser mais exato, aqueles que o são não possuem alto teor de álcool. Por esta razão, em inúmeras ocasiões, há orientação quanto a não ser muito dado ao vinho, pois era necessária uma alta dose para a intoxicação e embriaguez. Veja:

“É necessário, pois, que o bispo seja irrepreensível, marido de uma só mulher, sóbrio, prudente, respeitável, hospitaleiro e apto para ensinar; não deve ser apegado ao vinho, nem violento, mas sim amável, pacífico e não apegado ao dinheiro.” – 1 Timóteo 3:2-3 (NVI)

“Os diáconos igualmente devem ser dignos, homens de palavra, não amigos de muito vinho nem de lucros desonestos.” – 1 Timóteo 3:8 (NVI)

Concluímos, portanto, que há poucos incentivos ao uso do vinho e à bebida alcoólica em geral. Seja com muito ou pouco álcool, a Bíblia não parece nos encorajar a beber álcool. Mas isso não responde à nossa pergunta. Ainda assim eu não vejo razões explícitas para não beber de qualquer forma. Portanto, a pergunta ainda não foi respondida. O máximo que eu poderia dizer é: evite ficar bêbado, Deus não se agrada.

Agora, lembra que eu falei que discutiríamos alguns fatos de antes? Bom, o primeiro deles tem a ver com a Internet. Na época de Cristo, tudo era registrado em papel. Pra ser mais exato, as pessoas passavam umas às outras as informações, boca a boca. As notícias se espalhavam de forma orgânica, mas lenta. Não era possível, por exemplo, saber o que estava acontecendo aqui, na América, enquanto Jesus multiplicava o vinho. Não havia satélites nem cabos submarinos. Tudo era local. Hoje, temos o conhecimento do que houve lá, através dos registros históricos que nos foram traduzidos. Você deve estar se indagando: “e por que isso é importante?”. Já explico. O segundo fato é sobre a cultura. E aí já emendo o terceiro. Abordamos a questão do vinho, mas não da cerveja, do whisky e da vodka. Vejamos: a cultura ocidental condena o uso do cigarro, certo? Até pouco tempo (décadas atrás), Cristãos sinceros fumavam. C. S. Lewis é um exemplo deles. Isso nos encoraja a fumar? A mim não. Isso torna fumar algo correto e positivo? Não. Simplesmente mostra que a cultura tem uma influência pesada no costume. Apesar disso, é importante lembrar que há vontades absolutas e leis que Deus não abre mão. Nem nós deveríamos.

Por ser uma cultura diferente, beber vinho em festas era algo bonito e até honrável. Quando Jesus transformou o vinho, ou quando Paulo orientou Timóteo a tomar vinho para suas dores, estavam inseridos em um contexto completamente diferente. Além do fato de sabermos que o vinho era de baixo teor alcoólico e, possivelmente, ambos estarem se referindo ao suco de uva, ninguém postaria isso na Internet. Timóteo não iria tirar uma selfie com um copo de vinho na mão, com a seguinte legenda: “Valeu, Paulo. As dores estão sumindo. Viva o vinho!”. Não houve um trending topic com a hashtag #jesustomouvinho. Voltamos ao primeiro fato. O nosso mundo é altamente conectado e também expositório. As pessoas não se aguentam e postam tudo o que fazem. Não se importam se aquilo vai afetar negativamente os seus amigos. Não pensam na consciência dos demais e nem ao menos se preocupam com a consequência das suas palavras. Nossa cultura, interligada e conectada, esqueceu do amor.

Chego, portanto, ao cerne do estudo. Para responder a uma pergunta tão polêmica, não poderia me manter na superficialidade. No entanto, para mim, tudo se resume a isso: o amor, a Deus e ao próximo.

“Contudo, tenham cuidado para que o exercício da liberdade de vocês não se torne uma pedra de tropeço para os fracos. Pois, se alguém que tem a consciência fraca vir você que tem este conhecimento comer num templo de ídolos, não será induzido a comer do que foi sacrificado a ídolos? Assim, esse irmão fraco, por quem Cristo morreu, é destruído por causa do conhecimento que você tem. Quando você peca contra seus irmãos dessa maneira, ferindo a consciência fraca deles, peca contra Cristo. Portanto, se aquilo que eu como leva o meu irmão a pecar, nunca mais comerei carne, para não fazer meu irmão tropeçar.” – 1 Coríntios 8:9-13 (NVI)

“Não destrua a obra de Deus por causa da comida. Todo alimento é puro, mas é errado comer qualquer coisa que faça os outros tropeçarem.
É melhor não comer carne nem beber vinho, nem fazer qualquer outra coisa que leve seu irmão a cair.” – Romanos 14:20-21 (NVI)

A Igreja está esquecendo dessa verdade bíblica! A liberdade deu lugar à libertinagem e irmãos estão ferindo a consciência de irmãos. Deus deixou muito claro que se algo fere a consciência do nosso irmão, devemos deixar de fazê-lo.

“Tudo me é permitido”, mas nem tudo convém. “Tudo me é permitido”, mas eu não deixarei que nada domine.” – 1 Coríntios 6:12 (NVI)

Paulo diz isso após a severa advertência que citei acima, sobre os que não herdarão o Reino de Deus. Ele enfatiza a liberdade que temos, mas também deixa evidente que não permitirá que essas coisas o dominem. A liberdade que Cristo nos dá não é para dizermos sim, mas para dizermos não. Quem é verdadeiramente livre, é livre para dizer não ao pecado. Algumas pessoas – eu, em inúmeras ocasiões – colocam uma cerca muito próxima ao pecado. Há a cerca, mas é possível vislumbrar o pecado. Essa cerca, de acordo com a Palavra, deveria estar longe do pecado, em um local onde nós podemos nos proteger de verdade dele.

Após essa análise, acredito ser possível responder a essa pergunta. Para responder, preciso expôr minha opinião – que com certeza já está bem clara! Não citei algumas obviedades, como estatísticas de mortes no trânsito devidas ao álcool, ou famílias destruídas pelo alcoolismo. Não cheguei ao ponto de falar dos males físicos que o álcool causa, pois precisaria entrar na questão do corpo e dos cuidados, bem como da gula.

Para mim é evidentemente claro que beber álcool é errado. É tão claro quanto consumir cocaína ou qualquer droga ilícita. Não tenho dúvidas quanto a isso, mas quero deixar que você decida por si mesmo. O álcool é um mal à sociedade. Quem me conhece sabe da minha dificuldade em aceitar “o primeiro gole”. Como posso eu saber se não vou gostar tanto a ponto de me tornar um viciado? Ou então, como eu posso ferir a consciência dos meus irmãos? Pior ainda, e se meu testemunho de abstinência for a única forma que tenho para pregar o Evangelho a alguém? Esse testemunho é muito importante.

Cristãos de todas as idades, especialmente jovens, estão se entregando às liberdades que o mundo oferece, vivendo como o mundo vive.

Finalizo com um versículo e uma pergunta. O versículo:

“Assim, quer vocês comam, bebam ou façam qualquer outra coisa, façam tudo para a glória de Deus. Não se tornem motivo de tropeço, nem para judeus, nem para gregos, nem para a igreja de Deus.” – 1 Coríntios 10:31-32 (NVI)

A pergunta: você está bebendo para a glória de Deus ou para o seu próprio bem?